8 de julho de 2019

ADEUS JOÃO. LONGA VIDA A JOÃO.


*Texto escrito ao som de “Ave Maria no Morro” tocada por João Gilberto.
——

A morte de João Gilberto não é só um adeus a um dos maiores nomes da música. 

Ela põe em definitivo o silêncio e a sensibilidade na lista das espécies em extinção.

Afinal, a vida que levamos hoje não comporta mais a pausa. E ela era tudo o que ele tinha para nos dar.

A música que acontecia entrecortada por pausas. A vida que nos dava tempo para sentir.

Fui ouví-lo de novo e no descuido comecei a querer cantar junto. Foi bem difícil. 

João faz divisões fonéticas que dificultam a vida de qualquer cantor de chuveiro. 

  • “Madaaaame diz que a raça não melhora, que a vida piora”. 

  • “Madame diz que a raça nããããão melhora, que a vida piora”.

João fez músicas para se ouvir no silêncio não só nos seus shows, mas na vida.

João Gilberto antecipou em meio século o exercício de Mindfullness. 

Mas se os seus dedos tocavam o violão por horas, os nossos hoje só digitam. Ferozes e ansiosos. 

Nossa vida não tem mais o espaço para a pausa. Fomos engolidos por um eterno scroll down ladeira abaixo.

“Uma pessoa conhecida. Nossos sentimentos à família, tá ok?”, afirmou o Presidente em perfeita sintonia com essa vida (ou cova) rasa. 

O Brasil de hoje já não é mais de Joãos. É de Jairs. “O Brazil não merece o Brasil” já previa Aldir Blanc.

Mas, enquanto seguimos procurando a felicidade de arranha-céu, para todos aqueles que não querem “já ir” se acostumando, celebrem João Gilberto. 

Seus dedos e sua voz continuará nos colocando mais pertinho do céu. 

De onde hoje ele deve seguir feliz, cantando com seu banquinho e violão. 

Nenhum comentário: