A rua estava tranqüila. Os carros não ousavam cruzar a porta da casa daquele menino mais feliz do mundo. Tudo estaria tranqüilo se não fosse o barulho do motor dizendo que o papai havia chegado.
O que será que ele trouxe desta vez? O papai sempre traz um presente. Talvez as figurinhas que faltavam daquele Campeonato Brasileiro.
Papai carregava junto das figurinhas o sorriso e a satisfação de poder voltar para casa. De ter casa para voltar.
O menino mais feliz do mundo estava esperando papai na mesa da cozinha. Brincava com as flores da toalha colorida que a mamãe trouxe da última viagem à Minas.
Tereza colocou os pratos e o almoço simples. Com simples arroz, simples feijão, bife e batata frita. Tão simples que os grandes Chefs do El Bulli ainda não conseguiram identificar tal ingrediente que faz dessa a mais saborosa refeição do mundo.
O menino mais feliz do mundo teve sua refeição. Ele, seus irmãos mais velhos, papai, mamãe e Tereza que o fitava. Será que ela já previa algo? Como aquelas velhas baianas que lêem nossa sorte nos búzios, por 35 reais?
Em longos minutos e longa hora, o almoço de segunda-feira acabou.
Tereza saiu para cuidar dos seus afazeres, como arrumar os quartos, como arrumar sua humilde casa e casar com Agenor, que um dia ainda seria astro de telenovela.
Seus irmãos trataram de crescer, abandonar o Mega-Drive e se casaram com Mras. Pintos Fernandes, primas de Drummond. Já faz alguns anos que o menino mais feliz do mundo não os vê.
Assim como a mesa, a mamãe também envelheceu. Mas continua firme, em pé, como a árvore de Romã que tinha no quintal. Mães e mesas do almoço são sagradas. Tem mais coisas em comuns do que podemos imaginar.
Papai, de tantos caminhos possíveis, acabou por ser perder. A cadeira perdeu um dos pés. A saudade do papai se resumiu aos três pontos finais dessa história.
Por fim, naquela mesa, apenas sobrou o menino mais feliz do mundo. Não percebeu que todos haviam se levantado. Devia estar fazendo justamente aquilo que sua mãe dizia para nunca fazer: brincar com a comida.
Quando percebeu, o menino já não era mais feliz do mundo. Lentamente se levantou. Tirou os pratos, lentamente. Lentamente saiu pelo corredor e apagou as luzes da casa vazia. Trancou o portão. Lentamente.
De tão lento, envelheceu com a certeza de que não seria mais feliz do mundo. De que não haveria mais almoço como aquele que um dia o fez ser feliz do mundo.
Mas como uma boa criança, adolescente adulto, senhor das suas crenças, estava enganado. Felizmente enganado.
Hoje o menino mais feliz do mundo já não é o mais feliz do mundo. Nem mesmo menino. É apenas um papai morrendo de fome e de saudades da sua mesa do almoço de segunda-feira
Um comentário:
a q texto triste... me emocionei lendo esse texto... imaginei o monte de pessoas q um dia tiveram na vida pelo menos o minimo de uma vida digna.. e hoje estão nas ruas.. triste realidade. Acho q mtas pessoas deixaram lindo valores, como o almoço em familia...para trás...triste!
bjo Amanda
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