17 de fevereiro de 2008

A visita inesperada

*Inspirada na música "O Mundo é um Moinho" de Cartola.

Mais uma vez ela apareceu na minha casa. Chegou debaixo de um temporal de verão e tocou a campanhia. Pela janela, vi que estava toda encharcada, desamparada no portão. Deixei que entrasse em minha casa.

Dei toalhas secas, ofereci banho quente e um café feito ainda naquela manhã de segunda-feira. Como estava cansada de se aventurar pelo mundo, aceitou a ducha, as toalhas, as roupas de cama bem passadas e o colchão confortável.

Deitou e dormiu ali como criança.

Agora dorme tranquila. Já não é mais atormentada pelo sons angustiantes da rua. Chicotes de vento não açoitam mais seu dorso. Seus pesadelos se foram e pode até sonhar.

De vez em quando, caminho até seu o quarto e com cuidado abro a porta para vê-la dormir como um anjo, torto.

Dotada de uma alma vermelha, arredia e fulgás, pode a qualquer momento sumir pelas sombras da vida. Por isso, procuro tratar bem, falar baixo, pisar leve, não acordá-la. A qualquer descuido, logo se vai e voltarei a ficar de todo sozinho neste mundo.

Quando chega, é sempre uma festa. A casa inundada-se de cor, música e paz. Quando está por aqui, eu, um ser calado, me pego até a assoviar. Fico feliz em vê-la correndo pelos jardins, corredores e salas. Sua inquietude é minha calma.

Acontece que de repente parte sem avisar.

Tem ela esse costume imaturo de trocar os que a enchem de carinho por incertezas, por outros rumos, outros homens.

Parte pelas sombras e mundo volta a ser cinza, concreto e real. Eu deixo de ser poeta, escritor, sonhador e volto a ser bancário.

Passo então a rezar todas as noites ao pé da cama para que nada de mal possa ser acontecer e que Deus a traga de volta um dia.

Mas hoje é um dia alegre, pois habita em minha casa um anjo de nome Paixão.

3 comentários:

Anônimo disse...

Cabeça... vc escreve muito bem. Seu texto me lembra os versos que ouvi numa pela de teatro (Amor) que falava: "O amor esteve aqui, num dia como outro qualquer, súbito fomos apresentados..."
Qualquer dia mando para você ler.
bjos, Amanda

Anônimo disse...

Poeta...
Obrigada por fazer as minhas noites menos vazias.


"Passo então a rezar todas as noites ao pé da cama para que nada de mal possa ser acontecer e que Deus a traga de volta um dia.

Mas hoje é um dia alegre, pois habita em minha casa um anjo de nome Paixão."

Um beijo, muitos...

Simone disse...

"O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm..."

Adorei os textos, meu mais novo poeta preferido.

Beijos,
Simone